Campos de Trabalho e Libertação

Ben Abraham foi levado para Braunschweig porém ficou apenas um dia naquele campo, sendo transferido em seguida para Wochelde, que ficava a cerca de 20 quilômetros dali.

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Uniforme com emblemas codificados por cor. (Giz de cera).

Naquele campo, ele e os demais prisioneiros foram identificados por números e por um símbolo costurado em seus uniformes: um triângulo amarelo para os judeus; um triângulo vermelho para prisioneiros políticos; um triângulo rosa para os homossexuais; um triângulo preto para criminosos; e um triângulo roxo para os religiosos e para aqueles que haviam se recusado a participar da guerra.

No dia seguinte após chegar a Wochelde, Ben Abraham começou a trabalhar em uma fábrica de peças para caminhão chamada “Bussing”. Naquela fábrica havia estrangeiros que também eram forçados a trabalhar, mas que, aparentemente, não seriam mortos depois. Ele foi colocado no encargo da manutenção das máquinas da fábrica, com três outros mecânicos. A comida que recebiam na fábrica era relativamente boa, mas ele logo começou a pensar em formas de conseguir mais comida.

Porém, pouco tempo depois a situação mudou: os suprimentos da fábrica começaram a ser administrados pela SS, de modo que a ração deles diminuiu. Com a chegada do inverno, não havia mais frutas e o campo estava coberto de neve. Ben Abraham continuou com suas estratégias para conseguir mais comida, tornando-se conhecido por sua habilidade como mecânico e ganhando a simpatia dos gerentes estrangeiros, os quais, de vez em quando, traziam-lhe algo para comer.

Um de seus colegas de cela pediu sua ajuda para encontrar um jeito de entrar na despensa da SS, para pegar comida. Eles conseguiram fazê-lo sem problemas nas primeiras quatro vezes, mas na quinta vez, foram pegos. Ele acabou caindo dentro de um barril de geleia e por causa disso foi impossível esconder do oficial da SS o que havia feito. Ele e seu companheiro esperaram alguns dias para serem executados, mas aparentemente sua habilidade como mecânico era mais importante do que o “crime” e, por isso, ele não foi morto, mas levou 56 pauladas como punição.

Depois desse incidente, ele era seguido e monitorado o tempo todo dentro da fábrica, e assim para conseguir mais comida dos estrangeiros e sobreviver, ele teve a ideia de fazer isqueiros e vendê-los para os prisioneiros alemães em troca de comida.

Em março de 1945, chegaram novas ordens: os prisioneiros deveriam ser evacuados porque os americanos estavam avançando, enquanto os alemães retiravam-se, em pânico. Em 21 de março, ele foi deportado juntamente com seu grupo para uma fábrica em Braunschweig, onde ele não pôde encontrar nenhuma forma de conseguir comida extra. Ali disseram a eles que seriam transferidos para uma fábrica de armas em Watenstadt. Marcharam para a cidade de Braunschweig e a encontraram completamente arruinada por bombas incendiárias. Aqueles que não conseguiram continuar marchando foram executados pelos SS ucranianos que vinham na retaguarda.

Ele estava para ser enviado a Hildesheim logo depois de chegarem a Watenstadt, pois naquele local estavam localizadas as fábricas de munição. No entanto, Ben Abraham não se apresentou como mecânico e foi deixado para trás, permanecendo na famosa “Herman Göring Wärke”, o maior complexo fabril de armamentos pesados da Alemanha. Foi, então, transferido para um bloco onde todos os prisioneiros serviam como trabalhadores internos da fábrica, de modo que a comida e as condições de higiene eram melhores do que nos outros blocos. De qualquer forma, mesmo assim ele se arrependeu de não ter ido para Hildesheim, pensando ter sido infeliz a decisão de permanecer onde estava.

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Evidência aérea: Por que Auschwitz não foi bombardeada? (Pintura a óleo).

Certo dia, a “Herman Göring Wärke” foi bombardeada. Diferentemente dos SS, que entrarem em pânico, ele e seus companheiros prisioneiros não sentiram medo e ficaram na janela espiando. Ben Abraham viu quando metade do bloco 3, onde ficavam alojados os Blocaltester e os Kapos, foi destruída. Ele então pegou um prato de lata e correu para lá. De repente, um avião com barulho ensurdecedor passou por cima dele em voo rasante, sumindo em seguida. É possível que não tenha atirado porque ele estava usando o uniforme de roupa listrada, e talvez isso tenha salvo o campo do bombardeio total. Das fábricas nada ficou, mas nenhuma outra bomba caiu sobre os alojamentos dos prisioneiros.

Pouco depois, chegou a notícia de que os norte-americanos estavam avançando e, a qualquer momento, os prisioneiros ou seriam liquidados, ou seriam transferidos para outro campo. De madrugada, às 4 horas, SS despertaram os homens de seu bloco aos gritos e obrigaram-nos a transportar mantimentos e roupas para os trens que os levariam para a outra região da Alemanha.

Após carregarem os trens, ao voltarem a pé para o campo, ele e seu grupo encontraram uma enorme massa de prisioneiros que se encaminhava para os trens, sob os gritos apressados dos SS. Tratava-se de evacuar o campo rapidamente, pois os norte-americanos já estavam em Braunschweig. Ele e seu grupo acabou de misturando com os demais e eles embarcaram nos trens.

Começou então a viagem de trem em vagões abertos rumo a Neugame, lugar perto de Hamburgo. Felizmente chegaram lá com duas horas de atraso, e a essa altura os SS já tinham afogados todos os prisioneiros, segundo os ucranianos.

Chegaram a Ravensbruck depois de vários dias sem comer ou beber, viajando nos vagões abertos ao frio, ao sol e à chuva. Dos 70 prisioneiros que haviam sido colocados em seu vagão, somente 27 ainda estavam vivos.

O campo de Ravensbruck estava lotado com pessoas vindas de vários outros campos. Ali também ele se achou em apuros por tentar conseguir comida extra, mas foi salvo pelo Blockalstester de seu bloco – um alemão de triângulo vermelho que simplesmente trocou sua “marca de cão”, ou seja, a plaquinha numérica que todos os prisioneiros levavam no pescoço. Usando um novo número, ele não seria identificado. Como todos os prisioneiros do campo estavam muito debilitados, não havia a menor chance de ele ser reconhecido.

À tarde, um SS veio fazer a revista e chamou por seu número antigo. Como combinado com o Blockalstester, ele não se apresentou. O Blockalstester disse o SS que o tinha matado por ter roubado comida, e apontou para um dos cadáveres que estavam amontoados nas proximidades.

Um dia chegou a notícia de que a Cruz Vermelha iria transferir os prisioneiros para a Suécia, e que eles receberiam pacotes de mantimentos. Ben Abraham e seus companheiros não acreditaram em nada; pensaram que era somente mais uma piada dos alemães, mas, de fato, receberam os mantimentos. No dia seguinte, foram colocados em trens que supostamente iriam para a Suécia, no que também não acreditaram. Logo depois, praticamente todo o grupo que havia comido daqueles mantimentos começou a ter sintomas de forte disenteria.

Depois de dois dias de viagem, os SS disseram que a próxima estação havia sido bombardeada, de modo que teriam que prosseguir a pé até o campo mais próximo, localizado perto de Ludwiglust. Os Kapos desse campo roubaram deles quase todos os mantimentos que haviam recebido.

Em Ludwiglust, os prisioneiros foram colocados em barracões sem teto, com chão de areia e paredes sem reboco. Ali chegaram dois rapazes que tinham sido transferidos de Watenstadt para Hildesheim. Contaram que, dos 150 mecânicos que haviam sido transportados para lá, somente eles haviam sobrevivido. Os demais haviam sido mortos durante a evacuação do campo, sendo que os ucranianos e lituanos recebiam dos alemães um pedaço de pão por cada prisioneiro judeu morto.

Em 1º de maio – o dia em que Ben Abraham havia decidido que a Guerra iria acabar – os alemães disseram a eles que seriam evacuados novamente, pois os americanos estavam avançando. Sofrendo de disenteria havia vários dias, ele não tinha mais forças para se levantar e decidiu ficar ali mesmo. Mas um de seus companheiros ajudou-o a se levantar e caminhar até o vagão, pois um dos Kapos, já usando o uniforme da SS oferecido àqueles que se dispusessem a lutar pela Alemanha, disse a eles que os que ficassem seriam fuzilados.

Ele e seu companheiro entraram em um vagão abarrotado por 150 prisioneiros. Ao mesmo tempo, podiam ouvir a gritaria dos judeus de outros vagões, que fugiam dos ucranianos que os matavam impiedosamente.

Conseguiram um lugar perto da porta, ao lado de um SS gordo que depois desapareceu. Assim, tinham algum espaço para respirar, diferentemente de metade dos prisioneiros do vagão, os quais morreram sufocados naquela mesma noite, uns por cima dos outros.

Num estado já letárgico, sem forças para se livrar dos cadáveres amontoados ao seu redor, Ben Abraham ouviu gritarem: “Os tanques, os tanques!” Num esforço tremendo conseguiu levantar-se e olhar para fora: aproximava-se uma coluna de tanques, ostentando estrelas brancas de cinco pontas. Pensava ele que eram tanques russos, pois não sabia que os norte-americanos também usavam a estrela como símbolo.

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A Libertação. (Pintura a óleo).

Enquanto os tanques se aproximavam, os alemães fugiam, os prisioneiros russos se abraçavam e os judeus choravam – choravam sem parar.

 

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